domingo, 12 de setembro de 2010

RECULUTANDO AUSÊNCIAS!

Viajei outro dia pra rever irmãos distantes// e também alguma amizade extraviada// ajoujada ia comigo a prenda querida //atrás ficava metade de nossa vida//a frente outra metade pra ser vivida// Com astro-rei a iluminar a estrada //rumamos pra Santa Maria no setentrião//onde sempre temos muito carinho//das cunhadas e amigos em nosso caminho//além do mais velho e dileto irmão. Chegamos na buliçosa Santa Maria //ao anoitecer e qual ignotos filhos//sem fazer reservas em hotel algum//e não dispostos a fazer zumzum//decidimos ir pernoitar em Julio de Castilhos. Efetuamos o trajeto sem tropelias//já comemorando alguma qualidade// ao esquivarmos da fusarca juvenil//tão ao gosto da moçada estudantil// que perturba o sono em nossa idade. Um pequeno hotel à beira da rodovia//administrado por três membros da família// conquistou a nossa preferência//pela simplicidade, limpeza e a descência// da recepção até a portaria e a mobília. Os degraus da escada do aposento//com bom gosto e originalidade//chamou logo nossa atenção//na homenagem ao Pai da Aviação//criador e inventor de genialidade. Depois do banho restaurador// saboreamos caprichado lanche com legumes//providenciados pelo gentil hospedeiro//que àquela hora liberou o cozinheiro//ademais de jantar não temos costume. Aposento mui asseado e roupas impecáveis //na cama, banheiro e até na pia//convidando os viajores ao descanso// no ambiente bem acolhedor e manso//graças a dedicação do proprietário, sua mãe e uma tia. Dormimos um sono dos justos//e pela manhã em lugar dos galos//nos anunciar o novo dia raiando//ouvimos ruidosos motores roncando//tocados por centenas de potentes cavalos. Deixamos a cama quase de um salto//e após uma bela ducha pra reanimar//tomamos fartos cafés bem quentes// antes de retomar a busca de meus parentes//que a distância estava a separar//Passamos ao largo da histórica Cruz Alta//berço do Érico Veríssimo imortal//notável escritor d'O TEMPO E O VENTO// sobre nossa gente obra- monumento// épico integrante da literatura universal . Tomamos o rumo do planalto médio/e aqui o progresso é de outro mundo//passamos Ibirubá, Não-me-toque e Colorado//lavouras e indústrias pra todo lado//sempre na direção de Passo Fundo. Intenso tráfego de feriado nas rodovias//trevos e viadutos não faltaram no caminho// com a atenção para evitar surpresas//perdi da primavera muitas belezas//mas finalmente chegamos em Carazinho. Encontramos a cidade muito modificada//pelo progresso e tanto tempo passado//Procurando meu irmão só não fiquei pinel//pelo favor de um motorista de aluguel//que nos levou ao endereço indicado. Encontrei meu irmão muito disposto//embora já bastante surrado//pelos longos anos de trabalho e rigor//conservando ainda muita força e vigor//para usufruir a vida de aposentado. A maturidade nos tornou bem diferentes//de quando fomos moleques e colegiais//nos abandonou o viço e o brilho do olhar//mas restam muitas histórias a contar//nas quais nos consideramos geniais//Após bebermos uma cambona d'água em mates//nos convidou para o almoço a cunhada//alegando com alguma autoridade//conhecer o mentiroso desde a mocidade//mas ainda não se sente cançada. Mesa simples mas muita fartura//foi logo anunciando o meu irmão//que pra comer não cultiva nenhum luxo//carnes, feijoada, arroz e macarrão//e algum verde pra destrancar o buxo. Bebida espirituosa não se ouviu falar//mesmo que fosse uma gota pra remédio//Nem cigarros de que até criou tédio//pelos males que costumam causar//Na sobremesa saboreamos laranjas//do quintal entorno da moradia//por ele mesmo construída com esmero///à semelhança do mestre joão barreiro//pois desde guri cultiva inteligência e ousadia. Na garupa da tarde que fugia a galope//entre as nossas muitas gabolices//meu mano avisou aos filhos noutra cidade//que os tios queriam matar a saudade//deles que não viam desde a meninice. Sua prenda com bondade e paciência o amadrinha//desde os primeiros anos pela ferrovia//enfrentando as situações com muita manha//na alegria e na tristeza o acompanha//e raramente não vê a vida ser como queria.//Pra nos entreter pilheirou da própria sorte// com um polegar na serra circular truncado //que agora mais parece uma cabeça de cágado/ consequência do estranho corte. Quando o resto do dia cobriu-se de fumo// jantamos de maneira muito moderada// café, biscoitos e pão com pouca chimia// sem queijo, pois vou dirigir n'outro dia//e quero evitar a barriga estufada. Depois de escutar mais alguns causos// pedimos pousada e licença pra deitar// assim uma noite inteira de bom sono //por certo nos devolveria o entono// que a longa jornada acabara de tirar. Dormi pouco mas acordei com satisfação/ por encontrar meus pares muito bem de vida //com boa saúde, paz e nenhum conflito//graças ao Espírito Universal Infinito// cuja humanidade inteira Lhe deve guarida. Ao levantar achei o irmão cevando o mate // enquanto sua prenda já resmungava// na cozinha arrumando um bom café// e falando que saco vazio não pára em pé// eu respondi que muito cheio estourava. Foi rápido o desjejum logo vindo a despedida//com o trânsito matinal na consciência//e muitos trevos que me pareciam esquecidos// Uns motoristas malevas, outros atrevidos// e este tal feriado da Independência. Após beijos e chinchados quebra costelas// com o carro já lotado e abastecido// nos despedimos tal irmãos e cunhados //muito felizes e até mesmo aliviados//pela alegria de nos terem recebido. Na estrada o trânsito agora tinha mudado/carros com excesso de velocidade//usavam a pista que era do transporte pesado/ até a saída de Cruz Alta rumo a Colorado/ sempre em rodovia de boa qualidade. Pra trás deixamos o distrito de Pulador//que integra a histórica Passo Fundo// onde maragatos combateram ximangos outrora//no alvorecer da Rio Grandense aurora//numa das mais sangrentas refregas do mundo. Adiante esperava mais um nome histórico// na cidade do ximango Júlio de Castilhos // político hábil e advogado idealista/além de inconteste líder positivista/ lídimo herdeiro dos valorosos Caudilhos. O astro-rei a pino nos mandou ao repasto/e com o tal de apetite a nos fustigar,// chegamos numa galeteria muito ajeitada// que encontramos ali na beira da estrada,/ fizemos o pedido e quedamos a esperar. "Vai demorar um pouco" nos disse o garçom/ parecendo muito novo mas bem educado/; "fica um pouco distante o nosso aviário" !/ gozou outro que devia ser o proprietário// dando sinais de ser muito informado. Serviram primeiro toda a guarnição/ e finalmente trouxeram a jovem penosa// E para beber?, perguntou para mim// vinho branco seco de Val Feltrim!// respondi, e guaraná para a esposa. Comida boa e ambiente muito agradável/ elogiei logo para o alegre comunicador//que agradeceu e indagou com quem falava//de onde eu era e também por onde andava//sem tirar o olhar do meu chaveiro traidor. Falei que conhecia bem aquela cidade/ nela tinha trabalhado como vendedor// citando ainda nomes de um colega antigo// e de outro companheiro e ilustre amigo // que em Tupanciretã era grande doutor. Foi então que o empresário contou o fato/resumindo muito magoado o triste caso// do falecimento dos velhos genitores//acarretando insuportáveis dores //e o suicídio de meu amigo Carlos Mazo. Incrédulos ouvimos a pavorosa notícia/ e com minhas idéias em grande rebuliço/ nos despedimos do arauto sem ter pejo// mas demonstrando nosso grande desejo// de saber pormenores do trágico sumiço. Para revermos outros irmãos restantes//seguimos perplexos rumo de Santa Maria//que sendo ainda um pouco mais velhos // se constituem nossos grandes espelhos// a nos mirar nesta longa e vital romaria. Fomos direto pra casa de meu dileto mano / que do trabalho não tinha chegado ainda// contou sua esposa com pouca entonação/ falando com certo pesar no seu coração// pois já não nos víramos em nossa vinda. Pouco assunto e fomos ver outra cunhada/ última irmã da minha esposa que resta/ e nos acolhe sempre com alguma festa// morando ao lado da neta e da filha casada. Temos outros parentes e amigos em apreço/ que requerem muita atenção e carinho/ mas sempre falta tempo para os visitar//além das virtuais preferências a pagar//pois o tempo galopeia mas é longo o caminho. Pouca demora!, e "até a volta se Deus quiser"/dito com o motor já um tanto acelerado /e o veículo se alinhando para o poente/pras bandas em que empecei a ser gente/ sentindo serenar meu espírito lacerado. Tomamos o rumo de minha região natal/ buscando talvez refazer a mente estropiada/ passando pela centenária General Vargas /sentindo eflúvios do Loreto em descargas / seguindo em disparada pro Cacequi fatal. Chegando aqui não encontrei o que buscava/ da velha moradia e do primeiro colégio//nada mais era ou estava tudo mudado// Na rua agora só algum olhar encovado //e de outrora sequer vi um sortilégio. Ao abastecer num moderno posto central/ fui informado de vários nomes lembrados// alguns que se foram pra outra cidade// buscando realizar um ideal de mocidade// e outros com a saúde precária ou acabados. Nestes estava o casal Oscar-Ruth Machado/ que costumava ter uma notícia histórica//sobre o antigo Cacequi dos pescadores//ou do velho Ibicui com seus vapores// pra contar sempre com muita retórica. Abatido com tantas amizades que partiram/ meu espírito ainda esboçou certa reação// e feliz por ter a prenda querida ao meu lado/ revi no repente nosso recente passado/ e concluímos que era tempo de recreação. Com o tanque cheio encaramos a estrada/ em direção a Rivera na Banda Oriental/ decididos a não voltar pra Santa Maria/e a ficar em nossa cidade no outro dia/se Deus permitisse andar tudo normal. Percorremos a RS-640 até próximo de Rosário/servida pela BR-290 que leva a Uruguaiana// e dá acesso a BR-158 cuja vista à distância// contempla na direita toda a elegância// da Serra do Caverá muito antes de Santana. O Feriado Nacional atraíra aos ricos/ shoppings de Rivera muitos turistas// que movidos pelo dólar a preço atraente// fizeram das lojas um formigueiro de gente//e depois converteram as estradas em pistas. Tomamos cuidados com tais fatos viciosos/ chegando em segurança ao destino visado// atravessamos a linda e cuidada Santana// que com a vizinha Rivera há muito se irmana//e aqui quase sempre fico bem hospedado. Fomos direto como tantas vezes fizemos/ desencilhar o nosso já surrado fordeco// ao lado de outros belos e fogosos corcéis// depois exibimos das bodas nossos anéis// e a modesta bagagem com algum cacareco. Na recepção uma moça nos desejou boa noite/ num já familiar sotaque bem fronteiriço// pedindo minhas identidade e assinatura/pra evitar alguma surpresa ou amargura// e nos confiando pra camareira de serviço. Esta nos instalou num singelo aposento / do austero hotel já reformado por antigo// sem muito luxo mas bastante agradável//dispondo mesmo de uma boa cama inflável//onde até relaxamos antes do banho amigo. Saímos a passear e olhar algumas vitrines/ após cearmos um saboroso peixe badejo // regado por uma nobre Patrícia gelada//sob os atentos olhares da prenda amuada/ já exibindo sinais do peregrinar andejo. Nos recolhemos ainda muito cedo ao hotel/ nem sequer fomos ao tradicional cassino// pra arriscar nossos controlados cobres// temendo por certo ficarmos mais pobres// pois assim penso e ajo desde ainda menino. Assistimos um pouco de TV em Castelhano/e dormimos rodeados de anjos espirituais // que nos guardam sempre pela vida inteira/bastando tão somente que a gente queira/ a companhia desses guardiães celestiais. Outro banho rápido logo ao iniciar o dia/ nos preparou para outra grande jornada/ e após tomarmos um farto e saboroso café/ quitamos a conta e de novo saímos a pé/ encontrando alguma loja ainda fechada. Nas lojas abertas achei o que procurava/ mesmo algum supérfluo objeto de nosso desejo//duas balanças para controlar as calorias// algum vinho chileno e outras iguarias//não esquecendo uns belos nacos de queijo. Abastecidos e refeitos nos despedimos/ das hospitaleiras Rivera e Livramento // já pensando onde seria a próxima parada //pois sendo bastante longa essa estrada//já quando vendedor não me era do contento. Adiante chegamos na cidade de Dom Pedrito/ que deve aos índios Minuanos o seu nome/ buscando algum restaurante ou lancheria//cuidando que não servissem comida fria// mas não achando fomos a Bagé saciar a fome. Achamos a Rainha da Fronteira em festa/ comemorando feliz a histórica maravilha/ de ter sido o palco da batalha do Seival/ cujo chefe Souza Neto mais tarde General/ proclamou em 35 a República Farroupilha. Após rápida volta no centro em rebuliço// entramos na Santa Tecla, famosa avenida// lembrando um grande formigueiro em ação//devido o intenso movimento e circulação// onde finalmente encontramos comida. Num restaurante desses à beira da estrada/ onde comem caminhoneiros, sem ostentação/ com um cardápio simples e a mesa singela// pra que o estômago não devorasse a goela//e não viesse complicar nossa digestão. Frutas e legumes sem exagerar na carne// e logo terminamos com o maneiro almoço / saindo ali pelo entorno mesmo a caminhar/ pra mais fácil nosso alimento desgastar/ enquanto nosso celular tocava em alvoroço. Era a Dádiva Divina em nosso amado filho//alegando fundados motivos de inquietude/ agastado com as chamadas sem resposta// para os velhos pais dos quais gosta//que saíram a campear a perdida juventude. Depois de ouvirmos nosso zeloso herdeiro/ voltamos meio chateados para a estrada// que costuma punir os incautos com rigor// causando muitos prejuízos e dissabor// além de muita vida prematura arrebatada. Tal já ocorreu nesta região em que outrora/muitos, na Ibéria irmãos, em encarniçadas// e memoráveis campanhas de conquistas// sem nunca tirar os inimigos das vistas// nem das ricas terras por Deus abençoadas. Passamos por Hulha Negra e Candiota onde/ tem uma grande Geradora termoelétrica//que fornece muita força e a bela centelha/ que ilumina a Terra do Vinho e da Feovelha/ e uma histórica região que já foi tétrica. Por aqui nasceu a República Farroupilha/ cujo solo sagrado imitando a cor do breu/ pois foi encharcado no sangue dos imunes/ LANCEIROS NEGROS DE TEIXEIRA NUNES/ chacinados por Chico Pedro de Abreu. Jamais tal página será varrida da história/ de uma nação cujo penhor de dignidade// fora ardilosa e covardemente forjado/contra um bando de negros somente armado/ de lança e a falsa Promessa de Liberdade. Mas não vou, por certo, arrumar a história/ que alguém com acento já disse ser feita/ de reparações salutares e justiças tardias/ e muitas vezes até nos servem como guias/ contra as ações que a Lei Divina rejeita. Na cidade com o nome de Pinheiro Machado/ hábil chimango, senador e herói nacional/ fomos atentos com a polícia rodoviária/que nos parece sempre deveras temerária/ pra aquele que não respeita o código legal. Bem adiante cruzamos o trevo para Piratiní / Capital Farroupilha na época do Império/ vendo na distância até algum cemitério/ em que há muito repousam bravos por aqui. Esta viagem se aproximava agora do termo/ já nos deixando no âmago uma merencória/ sensação de nosso dever de fraternidade/ com os irmãos e também de fidelidade/ realizado aos amigos marcados na memória. Setenta e duas horas durou tal andejar/ por duzentas e vinte léguas nas querências//dos pontos cardeais escapando o nascente/ onde desconheço algum amigo ou parente/ a quem devamos prestar mais reverências.