Os dias que se sucederam foram de intensa atividade para minha pequena família. Inicialmente tratamos de acomodar nossos móveis e demais pertences, distribuindo-os de acordo com o espaço físico que a casa nos oferecia. Espaço esse que nos deixava muito a desejar. Guardávamos ainda presente na memória a estrutura de nosso chalé e de como o havíamos redimensionado quando o ocupáramos, a alguns anos passados. Esta moradia por não ser nossa propriedade e ser construída toda em alvenaria não nos deixava muitas alternativas. Com algumas modificações permitidas pelos móveis conseguimos arranjá-los da maneira que nos pareceu mais agradável e conveniente. O 'fuscão' fora contemplado com um acanhado abrigo, a guisa de garagem, só pra ele. Passo seguinte seria montar o Laboratório. Área física já fora providenciada. Funcionaria nas dependências da Santa Casa. Mais precisamente ao lado do Serviço de Pronto Socorro que também estava sendo estruturado naqueles dias. Em uma de minhas viagens antes da mudança, eu contratara a reforma e pintura das peças que seriam adaptadas ao uso do Serviço Laboratorial. Estava tudo pronto e assim tratamos de instalar os equipamentos e mobiliário. Este também fora providenciado previamente . Após alguns testes para verificação do funcionamento dos aparelhos e reagentes e, de posse da Licença Inicial para funcionamento, concedido pela Secretaria Municipal de Saúde local, decidimos que era chegada a ora de iniciarmos. Minha esposa me auxiliou durante a maior parte do tempo, desde os primeiros dias. Anos mais tarde também nosso menino nos auxiliaria escrevendo o resultado dos exames. Para isso fizera um curso e tornara-se exímio datilógrafo. Gradativamente a demanda pelo serviço começou a aumentar. Não aconteceu imediatamente, como eu esperava. Não me haviam revelado que um Laboratório Clínico da vizinha cidade de Pelotas mantinha um Posto de Coleta no interior da Santa Casa. Como a coleta era feita duas vezes por semana e os resultados só eram entregues nessas oportunidades decidi explorar o preenchimento dos espaços representados pelos dias em que aquele Laboratório não fazia coleta. Explorei também a possibilidade de atendimento de Urgência e à domicílio, com os resultados sendo entregues no menor espaço de tempo possível. Com esse atendimento diferenciado passei a constituir referência. Algum tempo depois o Laboratório de Pelotas desativou o posto de coleta. A grande maioria dos clientes era associada do INSS (INPS, naqueles dias do Governo Militar) que representava a maior parcela da demanda, e aditivamente, ainda pagavam razoavelmente pelos serviços prestados. Em poucos anos a decantada 're-democratização' tornaria inviável o convênio. De quando em vez surgia um serviço particular, na forma de "chek-up". Não era como esperávamos. Mas era sempre um diferencial e constituía um incentivo a continuar batalhando o credenciamento para atender o Instituto. Inexperiente na administração da relação com convênios tratei de oferecer a todos os pacientes a mesma presteza no atendimento. Em pouco tempo pacientes associados da Previdência Social queriam as mesmas regalias que os particulares. Tive que admitir moças que depois de treinadas me auxiliavam no laboratório. Surgiu a folha-de-pagamentos de empregados e, com ela todos os encargos sociais previstos em lei. Nos primeiros tempos, atendíamos os associados do INPS através da Santa Casa que embora não tendo o seu próprio, contava com o meu Laboratório. Nos completávamos. Quando o Instituto pagava a conta hospitalar a Santa Casa repassava-me os valores referentes aos exames. Mas ainda estava faltando eu atender os associados do INPS que não eram hospitalizados. Para isso providenciei a montagem do processo de petição visando o Credenciamento Pleno, para eu poder atender pacientes ambulatorias(externos) e hospitalizados. Tudo pronto, de conformidade com as normas de exigência. Era só aguardar, prometiam. Ao cabo de longo período de espera concluí que além das exigências já satisfeitas me estava faltando "Q.I.". Nessa época eu andava ainda mais impaciente. Tinha prestações do carro e da aparelhagem do laboratório a pagar. Nosso faturamento não cobria despesas profissionais e particulares. Num fim-de-semana fui com minha esposa e filho rever 'nossos velhos' em Santa Maria. De lá fui sozinho a cidade de Alpestre, nas barrancas do 'Alto Uruguai' onde, segundo um anúncio de jornal, estavam necessitando de um Laboratório. Localidade recém emancipada, pequena população, hospital pequeno e nas mesmas condições de onde eu me encontrava. Um único médico era dono de tudo. Conversamos e fiquei de responder brevemente. Retornei para Pedro Osório. Na passagem por Santa Maria apanhei minha esposa e filho. Em conversa com meu amigo e ex-mestre boticário que tornara-se presidente do partido político PDS resultante e sucessor da antiga ARENA, coloquei-o ao corrente dos fatos. Vaticinei que estava prestes a deixar sua cidade devido a demora no meu credenciamento. Reprovou-me por nunca lhe ter informado tal fato e prometeu-me providências. Demorou algum tempo. Nesse interim decidimos vender nosso chalé em Santa Maria. Com o dinheiro apurado pagamos todas as dívidas e resgatamos com desconto as prestações a vencer. O restante foi empregado na compra de um terreno em que mais tarde começamos a construir nossa atual casa em Pedro Osório. Algum tempo depois veio o tão esperado e batalhado 'credenciamento' para atender os pacientes do então INPS, mais tarde INAMPS, IAPAS e, atualmente, SUS. Este a maior fraude já cometida contra os associados e contribuintes, que de segurados nada têm. Pois qualquer desocupado, ou marginal criminoso quando, por ventura dele, for encarcerado , desfruta de mordomias e direitos não conferidos àqueles contribuintes que desde criança vêm sustentando e investindo suor e sangue, compulsoriamente, neste truculento, viciado e corrompido sistema previdenciário brasileiro. Vale recordar ao caríssimo e virtual leitor que um único detento custa aos cofres públicos nada menos do que três vezes o valor do maior salário mínimo de nosso País. Isto em valores 'estimados' pelas fontes que estão alinhadas com o governo. Convém lembrarmos também, as vezes que a mídia veicula informações sobre as inúmeras transferências do famoso mega traficante 'Fernandinho Beira-mar' cujo aparato nos é apresentado como mais complexo e oneroso do que a segurança do próprio Presidente da República, que já não é nada módica, se comparado com a dos mandatários do primeiro mundo. Isso tudo, e muitíssimo mais, tem um custo que o contribuinte não tem condições de calcular, e menos ainda de fiscalizar. Se avive respeitável leitor!. Amanhã você certamente vai estar lembrando destas humildes elucubrações. Com mais essa rápida, mas que julgo salutar divagação, retorno ao cerne de minhas remembranças. Àquela altura já plenamente credenciado pelo Instituo desisti da transferência para o norte de nosso Estado. Aconteceu de, enfim, verificarem que eu era detentor de um poderoso 'Q.I'. Faltara-me oportunidade de manifestá-lo. Quando conversei com meu amigo político, presidente de partido, eu na realidade estava a revelar meu 'Quem Indique'. Fiquei muito agradecido ao meu eterno amigo, ex-mestre boticário e 'Q.I.' profissional. Quem iria imaginar que esse dinâmico, atilado e humano profissional, para o qual "nada caía do céu", além de exemplar chefe de família, mais uma vez influiria no destino do 'já um tanto maduro' rapa-de-taxo. Com tantos dígrafos inseridos no nome, certamente jamais será esquecido o seu WILMAR AFFONSO GARRES. Que a Suprema Inteligência Universal o ilumine onde se encontrar. Nos deixou. Permanece sua querida família constituída pela esposa, filhas, netos e genros com quem mantemos estreitos laços de amizade e regular convívio como se minha família realmente fosse.
segunda-feira, 28 de dezembro de 2009
quinta-feira, 17 de dezembro de 2009
DEBAIXO DE MAU TEMPO
A Sorte fora lançada. Quero me fazer entender, com essa sentença, que a decisão de nos transferir fora tomada. Durante vários meses eu e minha esposa nos ocupáramos por reiteradas vezes do assunto. Analisamos sob todos os aspectos possíveis o futuro na Zona Sul de nosso 'Rio grande de São Pedro'. Creio que a proximidade com as cidades de Pelotas conhecida como "Princesa do Sul", e a hospitaleira Rio Grande, carinhosamente apelidada de "Noiva-do-Mar", pesaram muito em nossa decisão. Duas das principais cidades gaúchas que ainda hoje se destacam no cenário sul-rio-grandense. Com o decorrer dos anos fomos descobrindo a causa dessas duas belas e históricas cidades exercerem tanto fascínio em todos quantos têm a oportunidade de as visitar. Dois Centros econômicos, culturais, políticos e de importância estratégica para nosso Estado e País. A proximidade com essas duas cidades e outras menores, mas também detentoras de atrativos históricos-culturais como Jaguarão, Piratini , Bagé ,Arroio Grande e outras, terá contribuído sobremaneira para nos fixarmos nessa região. Mais adiante procurarei detalhar melhor suas particularidades. Não foi nada fácil deixar nossa bela "Princesa Universitária", como era então conhecida a cidade de Santa Maria. Em muitas oportunidades indaguei para minha consciência se teria eu tomado a decisão acertada. Em silêncio ela respondia-me que só com o tempo eu saberia em que empreitada havia envolvido minha pequena família. Em dado momento decidimos que seria no dia nove de janeiro de 1976, ou não seria mais. Abarrotamos um caminhão especializado em transporte de mudanças com nossos pertences. Além de nossos móveis, ainda muito bem conservados, com apenas oito anos de uso, juntamos alguns remanescentes equipamentos e reagentes, destinados ao Laboratório Clínico. A maior parte dos aparelhos de análises eu já havia transportado no nosso 'fuscão' em viagens que realizáramos anteriormente. Fora um cuidado que tomei visando proteger os aparelhos, pois no caminhão poderiam sofrer avarias devido os solavancos nas estradas irregulares, em obras, naqueles dias. Alguns trechos estavam sendo pavimentados, outros ainda eram "carreteiras" históricas. O caminhão foi carregado no dia anterior e passou a noite no depósito da criteriosa transportadora Bortoluzzi. Saiu pela madrugada rumando para o sul. Naquela noite dormimos na casa dos pais de minha esposa. Assim poderíamos nos despedir dos amados sogros, pais e avós. Estes 'desconcertados' com nossa partida, especialmente do 'neto' que ajudaram a criar até os sete aninhos. Foi 'dura' mas teria que acontecer cedo ou tarde. Ainda hoje, quando presenciamos nosso amado filho tomar ônibus ou avião, em busca de seu destino, eu não consigo deixar de recordar 'nossos velhos' administrando corajosamente o fluído lacrimal que os traía no momento dos beijos e abraços de despedida. A exemplo deles enfrento o mesmo ritual mas não tenho a mesma compostura. Creio tratar-se de uma espécie de 'assim caminha a humanidade' atrelada por laços de amor, amizade e respeito. A emoção teria cedido lugar ao cansaço físico que acabou por nos nocautear e adormecemos. Na manhã seguinte, já íamos longe quando o aurorescer do novo dia veio anunciar que o astro-rei continuaria a iluminar nossos caminhos como sempre fizera. Para trás ficaram nossos amores e amigos. Ficou nossa 'calorosa' Santa Maria que muito amamos. Ficou também nosso simpático e acolhedor chalé que nos protegeu e uniu por cinco belos anos. Fora alugado. Mais tarde seria vendido para resgatar outros compromissos e assegurar a construção de nossa atual moradia em Pedro Osório. Na estrada fizemos o desjejum com biscoitos e café preto para ajudar a afugentar o sono. Viajávamos em compreensivo silêncio. Era como se tivéssemos praticado algo abominável. Pelo menos eu assim me sentia, muito embora uma espécie de voz interior me consolasse dizendo estar eu fazendo o que era possível. Mas como me perdoar por arrancar o menino de sua amada avó. Ele já atinava pra muita coisa. A Inteligência Universal dotou-o de um Espírito muito evoluído que mercê sua sensibilidade já fazia perceber as situações sem maiores traumas. Depois de algumas horas na estrada, alcançamos o caminhão com nossa mudança. Estava tudo bem. Tomamos a frente e fomos almoçar um 'fiambre' de frango enfarofado nas proximidades da cidade de Canguçu. Nessa época ainda não existiam restaurantes de beira-de-estrada, como atualmente. A construção dessa Rodovia Federal foi mais um investimento feito pelo Governo Militar com a visão de satisfazer a necessidade do escoamento da produção desde a "região celeiro" até o porto marítimo da "Noiva-do-Mar". Porto esse que estava recebendo investimentos na reforma e melhoramentos, para satisfazer a crescente e, ainda promissora exportação que se verificaria com o programa de incentivo a agricultura, conhecido pelo nome de 'PLANTE QUE O JOÃO GARANTE', já no último quartel de governo do regime militar. A certa altura as nuvens encubriram o sol. Logo adiante começou a chover. Novo contato com a transportadora que novamente acusou estar tudo em ordem. Combinamos que o próximo encontro seria já na Cidade pra onde nos destinávamos. Tinham o endereço. Não tinham dúvidas. Tocamos na frente. Chegamos em Pedro Osório na metade da tarde, sob chuva copiosa. Fomos direto para a casa que doravante seria nossa moradia e da qual tínhamos a chave. Era construída em alvenaria com acabamento em reboco cinza- escuro, com bastante simplicidade. Prédio antigo de 'quatro águas' com uma aba na frente. Muro também antigo e bastante surrado pelas intempéries. A rua da frente não era calçada. Com a chuvarada acabou por surgir um pequeno riacho onde em condições normais seria uma sarjeta. Minha esposa e filho 'cavaram', num bar das proximidades, uma garrafa de refrigerante que consumimos com os biscoitos restantes. Enquanto aguardávamos a transportadora, resolvemos explorar nossa nova moradia. Atendendo a minha orientação um pintor 'feito a machado' andou dando uma lambuzada com tinta branca em todo o interior da casa. Estava assim,'reformada' para os novos moradores. Naqueles dias não havia disponibilidade de casas de aluguel pois a demanda era muito grande devido aos funcionários das construtoras e suas famílias ocuparem todas as disponíveis. Conseguimos aquela casa, uma das menos ruins, por influência do meu amigo e ex-mestre boticário. Estávamos a observar a 'pintura' interna quando vimos um 'cordão' liquido de coloração marrom-escuro escorrer pela parede branca. A água da chuva guasqueada penetrara no aposento através de uma rachadura na junção das paredes. Causou-nos uma impressão tão desagradável que abraçado a minha esposa e filho nos apertamos e choramos os três. Lembramos do chalé que deixáramos em Santa Maria. Era mais humilde na construção, mas não tinha goteira. Não demorou muito e a transportadora chegou. Com chuva e a forte correnteza na sarjeta, não era possível descarregar. A solução foi atravessar uma guarda do caminhão sobre a correnteza e assim, à guisa de ponte, foram transferindo os nossos pertences para dentro da casa. Nenhum estrago de importância foi registrado. A transportadora tinha sido cuidadosa, em que pese as circunstâncias do transporte. Somente alguns arranhões foram verificados no roupeiro. No restante estava tudo a contento. Acertamos e despedimo-nos dos transportadores e começamos a viver nossa primeira noite na cidade, DEBAIXO DE MAU TEMPO. Jantamos, ainda do 'teimoso' fiambre de frango enfarofado regado com goles de refrigerante. Deitamos e dormimos o sono dos inocentes. Estava começando mais uma etapa na vida do 'rapa-do-taxo' e sua aguerrida família.
sábado, 12 de dezembro de 2009
A TRANSFERÊNCIA
Uma vez mais me defrontaria com circunstâncias que exigiriam nova atitude visando o tão almejado sucesso e a realização pessoal, perseguidos desde a idade de dez anos incompletos, quando fui levado para a cidade de Cacequi,onde comecei, ainda cedo, o aprendizado do então ofício de Boticário. Foram longos anos de pertinazes esforços e confusos sonhos, dos quais algumas vezes como que 'despertava' banhado em suor e lágrimas. Finalmente, vinte anos após, estava eu preparado para exercer a profissão de "Farmacêutico", modalidade Bioquímico, na área de Análises Clínicas. De 'quebra', ainda poderia ser 'Responsável-técnico' por uma ou duas farmácias ou drogarias, enquanto não fosse possível ter a minha própria. Até que essa não era a prioridade maior, como veremos adiante. Tal atitude envolvia a "mudança" com minha família; na verdade era uma TRANSFERÊNCIA que deveria ser efetivada o mais breve possível devido a premente necessidade de Laboratório de Análises Clínicas na pequena cidade de Pedro Osório. Tal como a maioria das situações que envolvem tomada de decisão e atitude, esta mudança também seria exigente. Como enfrentar a idéia de viver longe de nossos amados familiares que tanto nos foram de valia. Nossas Mães,Sogras,Sogro, irmãos,cunhados, sobrinhos e amigos com quem convivêramos intensamente durante cerca de dez belos anos, e que assistiram a quase 'demolição' do "rapa-de-taxo". Esses mesmos amados, especialmente, a sogra que era MAIS UMA MÃE que eu ganhei ao casar com a filha dela. E os amigos que acompanhavam meus e,agora,nossos passos, pois minha esposa e nosso filho estavam sempre juntos comigo e com os 'troncos velhos'. Não faltava um para questionar o motivo de irmos embora para um local tão distante. Como responder ou argumentar para esses amores que nos acolhiam em seu convívio e que tanto nos apoiaram durante o período em que estive sendo 'remendado' em hospitais, e mesmo depois da longa convalescença, os esforços com a faculdade. Como justificar a decisão de deixar a Cidade Universitária em favor de um pequeno ex-centro ferroviário que sequer conhecíamos direito. Certamente que fomos duas ou três vezes a Pedro Osório, antes da transferência. Mas daí a conhecer o lugar correspondia a uma diferença comparável ao deserto do Saara. A família de minha esposa e sua numerosa parentela eram e são muito conhecidos e relacionados na bela Santa Maria. Eu contava só com a mãe e alguns irmãos na localidade. Em compensação tinha alguns amigos e ex-professores que poderiam ser acionados para tentar 'cavar' uma colocação profissional. Nenhum desses fatores contribuiu. Nem mesmo ocorreu-me de acioná-los. O fato de estar formado e preparado para exercer uma Profissão Liberal embriagava-me de tal modo que não permitia sequer imaginar um mínimo risco de insucesso. Afinal iria desempenhar a profissão numa comunidade onde havia necessidade dela. Convidado por um dos maiorais do local, amigo de longa data. Pelo que pudera observar e me fora 'projetado', em poucos anos eu estaria com o 'pé-de-meia' feito e poderia finalmente me dedicar ao estudo da Medicina, um velho sonho, há muito acalentado. Hoje, já 'surrado' pelas vicissitudes da vida e as voltas e contra-voltas que executamos, ponho-me a cismar e chego mesmo a questionar a decisão de ter abandonado tantos valores humanos e até mesmo ter sacrificado nosso 'belo chalé' de paradisíaco entorno, para abraçar um porvir que ao fim e ao cabo não nos levou muito além do que éramos na década de 60/70. Não aconteceu de ter eu 'dado com os burros n'água'. Longe disso. Não me posso queixar da comunidade que nos acolheu. Ela tem a sua cultura e sua consciência. Tem suas particularidades, assim como muitas outras. O Profissional sou eu. As decisões profissionais, certas ou equivocadas teriam e terão que ser tomadas por mim. As conseqüências, agradáveis ou não, foram e serão assimiladas por minha pequena mas aguerrida família. Aproximadamente um mês após ter me graduado em farmácia, iniciei o exercício profissional. Comparado com a maioria de meus colegas, eu já era "corôa" quando iniciei. Na plenitude da 'idade de CRISTO' eu estava iniciando a prática de uma das profissões mais antigas do orbe. Com as dificuldades, próprias da maioria dos começos, esse não seria diferente. Embora já vaqueano de outros tempos e outras lides, não estava imune às adversidades que se me iriam apresentar nos primórdios de minha nova profissão, na qual vislumbrei alguns traços de sacerdócio, ao cabo de longos anos de exercício. Foi por essa época que comecei a adquirir a consciência da dificuldade em viver e trabalhar honestamente em um País no qual a noção de moralidade, ética e respeito aos mais sagrados direitos do cidadão são irremediável e inapelavelmente desconsiderados. Devia ser a 'Idade da Razão' se manifestando no jovem que começava a colher os primeiros frutos como Profissional Liberal, depois de enfrentar alguma turbulência de ordem política, para a qual não havia sido adestrado. Materialismo à parte, o fato de termos deixado nossa simpática e acolhedora 'vivenda' em Santa Maria foi uma prova de resistência para o futuro do incipiente candidato a espiritualização nos anos vindouros. Para consolidar nossa permanência na localidade e resgatar as prestações pendentes contraídas com a aquisição dos equipamentos e reagentes laboratoriais, tornara-se-nos inevitável vender nosso chalé. As despesas de regularização do estabelecimento junto aos órgãos públicos municipal, estadual e federal eram e, ainda hoje, são consideráveis. Além do dispêndio em paciência, com a 'burrocracia', que nunca foi meu forte. Ah! e ainda devia algumas parcelas referentes à compra de um 'fuscão', que embora com vários anos de uso, estava em boas condições, em que pese a desagradável cor vermelha. Com o recurso apurado na venda da casa pagamos todas as pendências e ainda restou um pouco que foi parar na poupança. Passei a trabalhar um tanto mais aliviado. Era como se meu espírito tivesse sido liberado de um estado de asfixia. Só quem passou por tal situação pode compreender. A exemplo de outras atividades intelectuais, também no estudo da doutrina Espírita tenho evoluído a passos de tartaruga. Acredito, hoje, estar um tanto esclarecido a ponto de 'perceber' através dessa Ciência as respostas para muitas questões com que tenho me defrontado ao longo da existência. É um ramo fascinante de conhecimento e imprescindível para a formação e aperfeiçoamento daquele ser humano que se pretenda enquadrar entre os "criados à imagem e semelhança Divina". Não creio possuir o dom disciplinado, imperturbável e infatigável do perscrutador de supostas verdades reveladas. Mas certamente gastarei o restante de meus dias buscando, regularmente na ciência e Doutrina espíritas, informações que me possam significar a versão mais aproximada daquilo que minha consciência possa perceber como verdade.
sábado, 5 de dezembro de 2009
O DESAFIO
É possível que muitos professores, assim como vários colegas do Curso de Farmácia,jamais tenham percebido a assimetria entre meus braços, resultante do acidente automobilístico. Fato é que meu braço esquerdo resultou cerca de uma polegada mais curto que o destro. Quanto a funcionalidade era como se um complementasse o outro. A FISIOTERAPIA executada por longo tempo, operou maravilhas, mas não foi capaz de evitar prejuízos funcionais. Esteticamente nunca causou-me maiores aborrecimentos. Possivelmente devido a eu não ser suficientemente vaidoso. Nas aulas práticas tive sempre por parceiros colegas que não mediam esforços para que eu me sentisse à vontade. Destarte eu alternava minha participação como 'municiador' de materiais e reagentes necessários às práticas; em outras oportunidades eu tomava notas dos procedimentos e observações para a posterior elaboração do relatório, em conjunto com os demais do grupo. Entre os colegas com quem trabalhei em equipe ainda recordo dos amigos Dácio Moraes, Agueda Maria Brum, Alcides Cunha, Arno Bohrer, Celeste Marina Garcia, Ciro Ropke, Débora Cabral, Dilma Caetano, Elaine Fernandes, Elemar Rameyer, Eloá Diehl e mais alguns que a memória sonega, mas que inegável e decidamente contribuíram para que meu aproveitamento fosse considerado satisfatório e me permitisse colar grau junto com eles. A todos sou muito grato, e experimento grande alegria quando nos reencontramos ou quando 'virtualmente' nos comunicamos via internete. Também aos antigos ex-colegas propagandistas-vendedores devo grande parcela de apoio. Poucos reencontrei depois de formado. Alguns ainda trabalham, embora aposentados. Aldo Vianna, Jari Machado, Osvaldo Alfaia(já falecido),Roberto Waucher e muitos outros que perdi de vista e memória devido às próprias circuntâncias da existência. Aos farmacistas Osvaldo Santos Cerezer, Sadi R.Silva, Dirceu Nogueira, Pedro Machado e os irmãos farmacistas e farmacêuticos Arioly e Arany Barcelos também devo uma cota de reconhecimento e gratidão. Que a Inteligência Universal a todos conceda Paz, Harmonia e muita Luz, onde quer que se encontrem. Feitas essas tão necessárias e 'salutares reparações e tardias justiças' vou tentar rememorar a situação em que me encontrava logo após a formatura. Primeiramente solicitei perícia médica no I.N.P.S. Atendeu-me o Dr.IVAN MARQUES DA ROCHA, grande amigo e conhecido ainda do Cacequi, onde iniciara como médico-clínico. Informou que embora eu acusasse recuperação satisfatória, era temerário voltar a trabalhar dependente do automóvel.O mais aconselhável era a empresa à qual eu ainda estava vinculado me reciclar e aproveitar em outro setor com menor risco. Outra alternativa era a aposentadoria por INCAPACIDADE FÍSICA. Neste caso eu não mais poderia trabalhar com registro em carteira do M.T.P.S.. Surpreendí-o com a informação que estava formado em Farmácia, e pretendia me estabelecer com Laboratório de Análises Clínicas. Sendo ele também Advogado, argumentou que era um direito meu a aposentadoria, após cinco anos em auxílio-doença. Era muito importante eu ponderar a decisão de não aceitar o carimbo de 'APOSENTADO POR INVALIDEZ' na Carteira de Trabalho. Conhecia-me há muitos anos, desde balconista de drogaria no Cacequi. Depois como propagandista-vendedor. Como Farmacêutico-bioquímico imaginava que eu enfrentaria desafios ainda não avaliados. Era surpreedente e a primeira vez que alguém solicitava cancelamento do benefício, tendo direito a aposentadoria. Concordei que era um desafio que teria de enfrentar, afinal para isso estudara e me preparara. Quanto ao Benefício, serviria para outro. Me fora de importância decisiva naqueles cinco anos. Graças a competência dele e de sua equipe eu pude me reciclar para exercer com dignidade outra profissão. Serei eternamente grato a ele e ao Dr.Isidoro Lima Garcia Filho. Que Deus os ilumine e guie. Liberado do INPS, me apresentei na empresa da qual era empregado. Alegaram que no momento não existia nenhuma vaga a ser preenchida e assim a solução seria a recisão do contrato com a respectiva SAÍDA na carteira profissional do MTPS. A carteira da nova profissão emitida pelo CRF.RS ainda não fora recebida. Desligado da dita empresa, recebi uns restos de direitos trabalhistas atrasados e a autorização pra sacar o Saldo do FGTS. Com esse recurso somado ao valor percebido durante os meses que trabalhara no Hospital Brasilina Terra,em Tupanciretã e mais umas economias de poupança, consegui dar a PARCELA DE ENTRADA no pagamento dos aparelhos, reagentes e equipamentos que iriam estruturar o futuro 'LABORATÓRIO COELHO - ANÁLISES E PESQUISAS CLÍNICAS'. Este seria montado na cidade de Pedro Osório, por decisão influenciada pelo antigo amigo Mestre-boticário, nosso conhecido lá do Cacequi. Quando lhe fui 'levar em mãos' o Convite de Formatura, acabou por me persuadir a instalar-me naquela cidade, então promissora, na década de 70. Mais tarde as sucessivas enchentes do rio piratini modificariam as espectativas, obrigando muitos habitantes a buscar outras cidades. Outro fator responsável pela estagnação do município foi a desativação do transporte ferroviário de passageiros e também o fechamento da DORBRÁS, fábrica de dormentes de concreto, que operava na cidade. Na verdade, eu pensava em ir para o eixo Rio-São Paulo onde o parque industrial farmacêutico era e é cada vez mais desenvolvido. Entretanto depois que meu amigo, conhecedor de minhas potencialidades, acenou com muito boas possibilidades de progresso profissional, repensei e decidi me estabelecer na cidade dele. Pesou na minha decisão também, a opinião de outro amigo, o professor Dr. CLODOMIRO BERTOLDO, farmacêutico, meu orientador no estágio, com o qual discuti o assunto. Este fez-me ver as dificuldades que eu enfrentaria naquela região praticamente desconhecida, com familia e filho pequenos e já acostumados à calma sulina. Antes de efetivar a transferência para Pedro Osório, ainda surgiram outras cidades. Não despertou meu interesse devido a eu estar já comprometido com aquela. Não podia desapontar um tão caro amigo, agora empenhado em dotar com serviços médicos e para-médicos qualificados, para satisfazer a crescente demanda na sua cidade. Esta transformada em 'canteiro-de-obras', onde trabalhavam três das grandes construtoras de estradas, movidas pelos recursos que o governo investia, estrategicamente, naqueles anos da ditadura militar. Tempos em que a liberdade era duramente cerceada. Mas também eram tempos em que não havia(ou não éramos informados devido a mordaça na imprensa) o desrespeito com o cidadão trabalhador. A violência da repressão não fazia tantas vítimas como as que são feitas,hoje, em todos os quadrantes de nosso País, RESPALDADA pela DEMAGÓGICA DEMOCRACIA POPULISTA DO VOTO 'OBRIGATÓRIO'. Não desejo o retorno do 'tacão-militar' mas também não se pode ignorar o 'morticínio' promovido pelo 'crime organizado', principalmente nos grandes centros. Perpetrado por destemor às leis brandas e encorajado pela certeza da possível impunidade. Até por que as autoridades que deveriam legislar e fazer cumprir as leis são, no mais das vezes, os maiores corruptores das mesmas. A par desse sentimento, ocorre-me que a ousadia que moveu-me naqueles dias de 1976, nem de longe se compara com a que precisanos ter para continuar levando com dignidade a nossa vida e de nossa família na atualidade. Chego mesmo a pensar no tal de 'kaliuga' que os esotéricos e gnósticos reportam como sendo a era das transformações sociais. Outras vezes dirijo minhas atenção e vigilância para o complexo turbilhonar cósmico e suas conseqüências sôbre nosso belo Planeta e seus 'desajustados passageiros'.
quarta-feira, 2 de dezembro de 2009
UM MESTRE E COLEGA CARISMÁTICO!
Quando, depois de alguma relutância, cedendo aos apelos de meu amado filho, decidi realizar este ensaio, não ponderei a possibilidade de vir a ser traído pela memória ,especialmente em questões tão relevantes.Ela me parecera,sempre bastante satisfatória, se comparada a de outros 'mortais' da mesma faixa etária.Bisonho equívoco!.No entrevero destas MEMÓRIAS, inadvertidamente eu estava olvidando Mestres cujos nomes estão indelevelmente associados à própria dignidade dos novos profissionais por eles formados.Há que destacar o Dr. Alberto Heitor Schimidt,médico e Mestre, sempre disposto a oferecer um alerta para um ou outro caso 'bruxo' que costuma 'minar' a vida do profissional inexperiente ou pouco atento.O Dr.Antonio Jorge Dreon de Albuquerque,médico-veterinário, Mestre em VIRULOGIA, sempre lembrado, especialmente quando ocorrem surtos, ou pandemias virais que acometem grandes populações em todo o Planeta(ex. HIV,H1N1).O professor Farmacêutico Clóvis Silva Lima que mercê de sua capacidade e dedicação foi guindado ao honroso cargo de MAGNÍFICO REITOR DA UFSM. O jovem e brilhante farmacêutico Baltazar Schirmer, Mestre em Farmacologia, que já ocupou o cargo de Pró-Reitor,desempenhado anos antes pelo meu ilustre amigo e colega,então professor, Valter Bianchini, de quem já tive a satisfação de referir.A professora farmacêutica Glaúcia Ustra, dinâmica mestra.Hoje aposentada, mas dirigindo uma rede de farmácias de manipulação muito prestigiosa e bem sucedida.O professor Irineu Pazini, também aposentado, sempre à frente de seu criterioso Laboratório de Análises Clínicas.O professor Geolar Badke douto em Legislação e Deontologia Farmacêutica.A professora Idelares, da Química orgânica clássica, que o Onipotente Criador a ilumine.As queridas Mestras farmacêuticas Beatriz Dalla Porta(Citologia Clínica),Águeda Leal(Bioquímica Clínica),Marlene P.Leal(Microbiologia Clínica)e Anita de Conto(Parasitologia Clínica), professoras e orientadoras no período de Estágio, serão sempre lembradas por sua competência e dedicação integral ao ensino farmacêutico. Dentre todos sobressai a figura CARISMÁTICA do estimado mestre farmacêutico ANTONIO ROBERTO FONTOURA PEREIRA.Profundo conhecedor de Citologia, matéria que ensinou durante muitos anos, ao longo dos quais granjeou a simpatia e o respeito de alunos de todos os cursos, além da farmácia.Mercê de sua simplicidade, amizade, companheirismo,integridade e dedicação era sempre homenageado ora por um ora por outro curso. Ás vezes era alvo de mais de uma homenagem. Deve ter perdido a conta das vezes em que foi 'requisitado'como PARANINFO DE TURMAS. Tive a grata satisfação de me formar justamente numa turma que o escolheu como PARANINFO.Além de professor universitário, costumava oferecer cursos extra-curriculares com o mesmo desempenho e eficiência.Ainda conserva seu Laboratório Clínico especializado em dosagens de hormônios.Um dos primeiros surgidos no nosso Estado.Creio que o primeiro no interior.Seu refinado espírito de liderança rendeu-lhe a justa homenagem da "SEMANA ACADÊMICA PROF. ANTONIO ROBERTO FONTOURA PEREIRA".Exerceu o cargo de Secretário do Conselho Regional de Farmácia do RS.Foi membro do Conselho Federal de Farmácia que o galardoou com o "DIPLOMA E MEDALHA DO MÉRITO FARMACÊUTICO".Aposentado do magistério, continua com seu laboratório e a presidência da Associação Santa-mariense de Farmacêuticos-Químicos.É um desses profissionais que certamente engrandece qualquer entidade que o possa contar entre seus colaboradores. Segundo o historiador Eduardo Prado, "a história é feita de reparações salutares e tardias justiças"(História da Revolução Farroupilha, por Morivalde Calvet Fagundes,educs-martins,2a.ed.).Embora não seja historiador, sentir-me-ia assaz desconfortável com a consciência se tivesse a convicção de ter omitido deliberada e injustamente o nome de algum abnegado amigo que tenha me auxiliado. Neste caso cumpre-me penitenciar com os injustiçados ou esquecidos, que certamente não terão sua capacidade profissional e o brilho pessoal, obscurecidos pela amnésia de um 'biriva', ex-aluno chamado 'Rapa-de-taxo', que um dia abeberou conhecimentos na fonte onde esses mestres eram manancial.
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