terça-feira, 6 de outubro de 2009

ADEUS AOS ANOS DOURADOS

Com vinte e cinco anos e alguns meses de existência, de alguma maneira, eu já me achava um tanto amadurecido. Não que estivesse velho. Na verdade ninguém se sente velho nessa tenra idade, mas em algum momento de minha ainda curta existência tinha eu perdido a noção da mocidade adolescente dos últimos dez anos. Tinha dissipado meus mais dourados anos, intensamente, trabalhando e estudando. Havia desfrutado de um período de férias, quando eram de 20 dias, ainda. Das outras, sempre vendera a metade para fazer caixa. Vivia com parcimônia e austeridade. Tinha adquirido um apartamento na planta, financiado pelo BNH. Pagara a entrada e estava pagando as parcelas mensais regularmente. Não demoraria muito a tomar posse do mesmo. No trabalho era prestigiado. Tido como um dos melhores vendedores-propagandistas da empresa, que havia pouco concedera aumento salarial para a categoria. Já havia prestado concurso público para a EBCT – Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, mas não tomei conhecimento do resultado. No concurso da UFSM – Universidade Federal de Santa Maria, fui classificado e nunca me chamaram, para a função de chefe de portaria! Em 1963, realizara curso intensivo, na Base Aérea de Canoas, para Oficial da Reserva da Aeronáutica. Fora reprovado no “psicoteste”. Inscrevera-me para integrar o então Batalhão de Suez, que guarnecia a temerária Faixa de Gaza, no Oriente Médio. Fui “nocauteado” pela insuficiente altura física. Na retrospecção desses resultados conclui ser o ramo de medicamentos o meu chão. A ele agarrar-me-ia com unhas e dentes. A noiva já esperava “pacientemente” há cinco longos anos. A faculdade de farmácia, ainda seria preterida em favor da rentável profissão de vendedor por mais algum tempo. Estava tudo sob controle. Não haveria mais reveses. Mobiliamos um apartamento, alugado, até que recebêssemos o nosso próprio. Casamos de “papel passado”, no Civil. O “Religioso” foi na Catedral de Santa Maria, cercado pelas paredes cobertas por belas pinturas do italiano Aldo Locatelli. Meus amigos e, agora, testemunhas de “enforcamento” prestigiaram-nos. Sem aprontar qualquer caçoada. Admiráveis e inesquecíveis amigos. Outros estavam presentes, mas aqueles marcariam mais profundamente minha memória. Lamentavelmente meus testemunhas de casório já foram convocados para servir o Plano Espiritual. Até alguns anos passados vivia, o Alvino Candido Michelotti, ex parceiro de apartamento e brilhante professor na U.F.S.M., mais tarde doutorado em Lingua Portuguesa. Era casado com a também professora Alaide Canto Michelotti. Há muito não os vejo nem deles tenho notícia. Um velho amigo desde o Cacequi, Darci Madruga e sua filha Suzana também me prestigiaram. Ele há muito deixou este nível de existência. Ficaram as queridas Nena, sua viúva e a filha, minha testemunha, que às vezes revemos com muito carinho. Os inesquecíveis amigos e 'fratelos' de tantas 'jornadas' INDIO DA CUNHA PINTO e sua querida LEONIDA, também brilhante educadora santamariense. Ele, prematuramente, nos deixou, ficando sua querida 'NIDA' a quem vez que outra reverenciamos com nossa visita. O ANTONIO CARLOS MAZO MARTINS, o mais próximo dos amigos, pelo companheirismo desde o serviço militar, quando servimos juntos na mesma enfermaria regimental e vivenciamos o 'Bivaque' em Porto Alegre, antes da Legalidade. E também fomos parceiros no famoso "pombal"- pensão da dona Olga(final de 1961/início de 1962)- na rua doutor Bozano, frente do quartel dos Bombeiros, em cujo local hoje se eleva um arranhacéus. Mais tarde alugamos uma casa na rua Araujo Viana juntamente com o INDIO que também servira na mesma unidade militar,III B.C.C.L., já referido anteriormente. Dessa casa nos transferimos para um apê na rua do Acampamento,onde naqueles dias, seríamos vizinhos da 'Rádio Guaratã de Santa Maria'- do radialista Zapi- ainda muito jovens. Nesse apê se nos ajojou o Lopes, ex companheiro da mesma caserna, agora Sargento do Exército. Foi o último a integrar 'os mosqueteiros'. Também foi o primeiro a abandonar o quarteto, para casar-se. O próximo fui eu, pelo mesmo motivo. Restaram os saudosos amigos 'Carlão'(Carlos Mazo) e o ("grande cacique") Indio que seguiria nossos exemplos de 'homens sérios'. O Carlão, que junto com sua irmã Norma testemunhou meu 'enforcamento', formar-se-ia Médico e, após dois ou três anos de Residência em Cirurgia Médica, iria clinicar na cidade de Tupanciretã, onde seríamos contemporâneos durante alguns meses no Hospital Brasilina Terra. Ali respondi pelo Laboratório Clínico nosocomial logo que concluí o curso de Farmácia-Bioquímica. Foi nessa empreitada que arranjei dinheiro para enfrentar as despesas de "colação de grau" naquele já distante 03 de dezembro de 1.975. Esse amigo, brilhante e abnegado médico casaria, mais tarde, com Suzana Bheregary que fora minha colega na Farmácia-Bioquímica, turma de 1.975. De todos esses amigos guardamos, eu e minha prenda, as melhores recordações. As mulheres, felizmente, ainda vivem saudáveis. Os amigos, conforme relatei em outros capítulos, cumpriram seu tempo e foram chamados para o plano espiritual, deixando entre seus pares e amigos uma imensa mas carinhosa saudade.

Durante oito dias viveríamos nossa Lua de mel na linda Gramado- na serra gaúcha- e na gélida Lajes em Santa Catarina, em pleno mês de março de 1968. Creio que foi durante esses dias que, sem perceber, minha jovem esposa e eu estivemos a dar 'adeus aos anos dourados'. Retornamos e apliquei-me ao trabalho. Minha responsabilidade aumentara. Durante minhas ausências, nas viagens, minha jovem esposa ficava na casa de seus pais, um tanto distante de onde morávamos. Com o tempo, mudamos com “mala e cuia” pra junto deles, até nosso “apê” ser acabado. Minha “Regina”' ficara grávida de nosso único herdeiro, que agora já está criado e voando bem alto graças ao Bom Deus!. Dele espero poder montar “remembranças”, mais adiante.

Agora vou relatar os apuros de um viajante que aceitou uma carona, indevidamente. Retornava ele, que sou eu, de uma das reuniões já mencionadas, em Porto Alegre. Costumeiramente, viajando de ônibus. Parada em Cachoeira do Sul, para jantar. Terminado o mesmo, acomodei-me na poltrona e fiquei observando através da janela do coletivo. Momentos depois um amigo e colega de profissão entrou e me tirou do ônibus para viajar com ele para Santa Maria, alegando que não gostava de viajar sozinho durante a noite. Além do mais, dizia, o carro tinha “calefação” e chegaríamos bem antes do coletivo, em nosso destino comum. Não duvidei, e pra lá nos dirigimos, pela estrada molhada, esburacada e ainda sem asfalto. Faltando uns trinta quilômetros para chegarmos ao destino, o carro afundou em uma massa de água e barro existente na estrada onde estavam fazendo cortes para construir os “pegões” de uma ponte na, hoje, rodovia BR 287. Em instantes o carro encheu de água e lama. Tiramos nossas malas e bagagens para o mais alto que possível. Estávamos secando velas e outros componentes do motor do carro, que até dava sinais de reação. Nisso chega o ônibus referido. O motorista, gentilmente, nos ofereceu socorro. Agradecemos. Pois nosso ”fuca-pé-de-boi”' estava dando sinais que não nos deixaria na mão. O motorista do coletivo tocou embora. Entretanto o nosso 'veículo' não confirmou os sinais. Resultou que passamos a noite, desde as vinte horas até próximo das cinco da manhã seguinte, dentro do carro, com água e lama até os joelhos. Pela madrugada um caminhão bem ali próximo roncou o motor. Somente, então, nos “tocamos”!. Pedimos socorro. Ele nos rebocou até a cidade. Havíamos levado mais de doze horas para percorrer 130 km de Cachoeira do Sul até Santa Maria. O coletivo percorria em 2 horas e meia. Por Solidariedade com o companheiro paguei aquele “mico”. Por muitos anos não pegaria mais carona. Não demorei muito a ter meu próprio carro, um VW sedan 1962. Creio que até hoje tenho os pés enregelados, decorrência daquele banho de água e lama frios.

Um comentário:

Pauta Cifrada disse...

Especial!!! Beiçudo!!!