sábado, 3 de outubro de 2009

MAIS UM CONTRATEMPO

A notícia de minha aprovação para o curso de Farmácia da UFSM alegrou muito minha família. Era a primeira vez que um membro da linhagem Coelho percorria e vencia todos os níveis escolares e agora a barreira do vestibular. Na verdade não perceberam muito bem o valor daquela conquista. Pois a mesma não parecia trazer resultados imediatos. Além do mais todos entendiam que eu tinha já um nível de escolaridade suficiente para ter um bom emprego. Tanto assim que eu estava bem empregado como Representante Comercial. Ah, outra vez a memória dá uma claudicada: Estava omitindo um acontecimento que marcaria minha existência até os dias atuais. Em 1963, quando eu cursava a quarta série “esbarrei” com uma colega que cursava a primeira série ginasial noturno, no mesmo educandário. Depois de algumas “negaças” nos tornamos namorados. Na época em que passei no vestibular já éramos noivos. Ela e sua família sempre me apoiaram. Minha vitória no vestibular os contentou muito. Anos depois nos casaríamos. Mas disso falo oportunamente.

A vitória, embora suada, não se me afigurava como consagradora. Lutara por mais. Pretendera medicina. Tentaria novamente anos mais tarde. Comemoração e ''bebemoração'' moderadas. Tinha que tocar a vida com os pé no chão. Continuei na representação comercial. Certa vez participando de uma reunião em Porto Alegre, fui informado que seria transferido para Passo Fundo na mesma função. Argumentei que não poderia aceitar dita transferência por estar cursando faculdade em Santa Maria. Não gostaram da informação, que aliás, já lhes era do conhecimento. Eu fora dedurado por invejosos. Despediram-me. E aí a situação se complicou. Não tinha como manter-me sem trabalhar. Teria que arranjar outro emprego, urgentemente. Acolheram-me, novamente, como auxiliar na última farmácia em que trabalhara anos antes. A carga horária na faculdade tomava-me todo o tempo, em dois turnos. Podia trabalhar poucas horas semanais. Especialmente sábados e domingos. O ganho resultante mostrava-se insuficiente pra minhas despesas, agora aumentadas com a faculdade. Quebra-cabeça. A poupança feita no Cacequi já fora usada como sinal na compra de um apartamento “na planta”. E haviam mais as prestações mensais contratuais. Um razoável pepino para um calouro universitário com o coração “blandito” de amor. Recordei ainda uma vez do saudoso irmão Paysano: “Sempre existe uma saída”. A Inteligência Universal se encarregou de apontá-la.

Para espairecer, fui ao cinema, sessão das 22 horas, sábado, depois que saí da farmácia. Não “solito”. Deus me acompanhava. No foyer do cinema, enquanto aguardava o início da exibição, dirigiu-me a palavra um cidadão muito bem apresentado. Disse que estava querendo falar-me havia já alguns dias. Era representante comercial e vira-me algumas vezes fazendo propaganda em consultório médico. Perguntou-me se não estava disposto a trabalhar na empresa em que agora ele seria supervisor. Considerei rapidamente a situação. Respondi-lhe que aceitava, mas antes teria de desligar-me da farmácia. Trataria disso no dia seguinte, Domingo. Perfeito! Deu-me seu cartão de visitas, no verso do qual me apresentava como seu “candidato”, ao gerente da firma. Haveria outros candidatos. O resto era comigo, na entrevista. Depois do filme fui dormir o sono dos justos. Domingo fui trabalhar, e tratar do desligamento, com o bondoso patrão. O qual mais uma vez foi compreensivo. Rápida visita a noiva. À meia-noite tomei o ônibus para a capital, aonde cheguei por volta das sete horas. Troquei o ônibus, por um táxi e rumei para o endereço indicado no cartão. Nessa época o trânsito ainda era calmo na capital. Na frente do prédio da empresa farmacêutica, já esperavam vários candidatos. Um friozinho percorreu-me a coluna espinhal. E agora? “Não está morto quem ‘peleia’”'... Valha-me "O poder do pensamento positivo" de Norman Vincent Peale. Corri os olhos na fila. Peguei o cartão de apresentação, escrevi no verso, num espaço ainda restante: "Senhor Gerente, sou o candidato de Santa Maria, indicado pelo senhor “Cicrano”. Sou o número doze da fila. Favor não decidir nada antes de falar comigo". Pedi à secretária que entregasse aquele cartão do supervisor para o Gerente. E aguardei. A fila, que havia aumentado um pouco, depois de minha chegada, começou a desaparecer. Lá pelas tantas, convidado a entrar, cumprimentei o suposto gerente, desejando-lhe Bom-Dia. Mandou-me sentar, e exibindo o cartão com a minha mensagem, indagou se era eu o portador do mesmo. Respondi afirmativamente. Cumprimentou-me dizendo:

-Muito bem senhor Coelho! A vaga de Santa Maria lhe pertence. Parabéns!

Eu estava novamente bem empregado. Eu, um “Dezembrino”!

Pra quem DEUS promete, não falta.

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