Em meio a pragas de gafanhotos em dois anos seguidos, não recordo os anos, alguns mais vividos afirmam ter sido em 1947/48. Outros asseguram ter sido em 1948/49. Certo é que as "nuvens" aterrissavam no milharal e deixavam só os tocos que ainda verdes brotavam e produziam o suficiente para impedir nossa inanição. Não sei detalhes, mas creio que metade do que sobrava dos "esqueletinhos" ainda era dividido com o senhorio. A julgar pela equipe de homens que abria as valetas para onde "varríamos" os insetos que a seguir eram "incendiados" com gasolina ou querosene. Penso que tais abridores de valeta eram empregados e possivelmente "fiscais" do senhorio para avaliar o lucro cessante. Alguns insetos conseguiam fugir do fogo e mesmo impregnados de combustível não escapavam aos galináceos sempre vigilantes. Ao serem abatidos e preparados com arroz essas aves revelavam gosto estranho e impróprio para consumo. Minha mãe entendia que eram os gafanhotos responsáveis, inclusive pela má qualidade dos ovos. Muito tempo depois as aulas de química-fisiológica iriam corrigir tal entendimento. Ocorre que os galináceos, sendo insetívoros contumazes, ao ingerirem os gafanhotos impregnados de combustível acabavam por conferir má qualidade a sua carne e inclusive aos ovos.
Êpa! A "nuvem de gafanhotos" de tão “macota” quase me escurece o ambiente aqui, só em lembrá-la... Passou! E já vai distante a época em que desmataram a região missioneira para plantar linho. Hoje a monocultura está em desprestígio, o desmatamento sob vigilância da AGAPAM e as pragas sob controle. Neste ponto permito-me uma breve recapitulação: falta do Pai, maioridade dos manos mais velhos, estiagens prolongadas, gafanhotos, terra exaurida, gado de leite, de tração e montaria necessitando ser renovado, filhos analfabetos e o braço, até então férreo, dando sinais de oxidação. Todos esses gafanhotos, digo, essas mutucas tirando sossego no imo de minha santa e heroína-mãe que continuava a olhar “cismarenta” para os filhos ainda em casa. Foi por essa época que vasculhando um velho e tosco baú descobriu duas jóias: Seu vestido de casamento que cansado de ser "alvo" frente às vicissitudes da vida, "amarelara". A outra jóia, uma Lousa-abacial, tem que ser "dessecada": é uma lâmina de ardósia retangular, polida, emoldurada em madeira, tendo num dos lados vários fios de arame contendo cada fio dez esferas furadas que deslizam ao longo dos fios. Era uma espécie de calculadora HP naqueles dias e auxiliava estudar aritmética/matemática. Na outra face aprendia-se a escrever.
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